Arritmia cardíaca: quando o potássio baixo é a causa — e não a troponina
Entenda como a hipocalemia altera o ritmo cardíaco e quando investigar além da troponina
13/12/2025
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No plantão da urgência, o raciocínio clínico precisa ser rápido, mas não pode ser automático. Em um caso recente, uma arritmia cardíaca chamou atenção da equipe médica. A hipótese inicial foi direta: síndrome coronariana aguda, com foco quase exclusivo na troponina.
O problema?
A troponina estava normal.
Quem gritava no exame era outro marcador: potássio perigosamente baixo.
Este tipo de situação é mais comum do que se imagina — e revela um erro clássico de interpretação na urgência.
O caso do plantão: arritmia, monitor apitando e o foco errado
Paciente em monitorização cardíaca, apresentando arritmia ventricular intermitente. ECG alterado. Conduta inicial:
“Colhe troponina, deve ser infarto.”
A troponina veio negativa.
Foi repetida. Continuou negativa.
Enquanto isso, o laboratório liberou um resultado que passou quase despercebido no início da discussão clínica:
➡ Potássio: 2,9 mEq/L
Ou seja, hipocalemia grave, plenamente capaz de explicar:
arritmia;
alterações no ECG;
instabilidade elétrica miocárdica.
A insistência na troponina atrasava o tratamento correto: reposição imediata de potássio.
Por que o potássio baixo causa arritmia?
O potássio é essencial para o potencial de membrana das células cardíacas. Quando está baixo:
ocorre hiperexcitabilidade elétrica;
há atraso na repolarização;
surgem extrassístoles, taquiarritmias e arritmias ventriculares graves.
Hipocalemia pode causar:
ondas U proeminentes;
prolongamento do QT;
achatamento da onda T;
arritmias potencialmente fatais.
Tudo isso sem qualquer relação com infarto.
Troponina ≠ causa de toda arritmia
A troponina é um marcador de lesão miocárdica, não de arritmia em si.
Ela pode estar elevada em diversos cenários:
sepse;
insuficiência renal;
taquiarritmia sustentada;
insuficiência cardíaca.
E pode estar normal em quadros graves de arritmia elétrica primária, como nos distúrbios eletrolíticos.
👉 Arritmia não é sinônimo de infarto.
Erro comum na urgência: raciocínio em trilho único
O que esse caso escancara?
Foco excessivo em um único marcador (troponina);
Desvalorização de eletrólitos básicos;
Pouca integração entre laboratório e clínica;
Risco real de atraso terapêutico.
Enquanto se insistia em repetir troponina, o paciente seguia com risco de arritmia maligna, quando a conduta correta era clara: corrigir o potássio imediatamente.
O papel do laboratório nesse tipo de situação
Nesse cenário, o laboratório não é coadjuvante — é determinante.
Potássio baixo:
explica o quadro;
muda a conduta;
salva tempo;
salva o paciente.
Mas isso só acontece quando:
o resultado é liberado com agilidade;
o valor crítico é comunicado;
há diálogo real entre laboratório e equipe assistencial.
Lição clínica do plantão
📌 Antes de rotular uma arritmia como “infarto”:
olhe o potássio
avalie magnésio
revise gasometria
integre ECG + laboratório
📌 Troponina ajuda — mas não pensa sozinha.
📌 Distúrbio eletrolítico mata rápido se ignorado.
Em Síntese
Este caso de plantão reforça uma verdade simples e frequentemente esquecida:
nem toda arritmia vem do coração isquêmico — muitas vêm do desequilíbrio químico.
O potássio baixo era o vilão.
A troponina só estava sendo acusada injustamente.
Pensar além do automático é o que diferencia conduta protocolar de conduta segura.
📌 Pensar laboratório é pensar segurança
✔ Reforce o raciocínio clínico baseado em eletrólitos, não apenas em marcadores cardíacos.
✔ Evite atrasos terapêuticos causados por interpretações equivocadas.
✔ Valorize o papel do laboratório na urgência, especialmente em casos de arritmia.
✔ Aprimore sua prática profissional com base em casos reais e boas práticas laboratoriais.
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📚 Fontes e referências
UpToDate — Hypokalemia: Clinical manifestations and treatment
American Heart Association (AHA) — Arrhythmias and electrolyte disturbances
European Society of Cardiology (ESC) — Electrolyte imbalance and cardiac arrhythmias
SBPC/ML — Boas práticas laboratoriais em urgência e emergência
Manual de Distúrbios Hidroeletrolíticos – Ministério da Saúde

