Eventos neurológicos após infecção aguda por dengue: complicações, mecanismos e sinais de alerta

Complicações neurológicas associadas à dengue, manifestações clínicas e importância do diagnóstico precoce

19/12/2025

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A dengue é conhecida principalmente como uma doença febril transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, com sintomas clássicos como febre alta, dores musculares e rash cutâneo. No entanto, o vírus também pode desencadear complicações neurológicas após a fase aguda da infecção, um conjunto de desfechos ainda pouco compreendido mas que tem atraído atenção científica recentemente.

Um estudo robusto publicado em 2025 na JAMA Neurology abordou exatamente esse tema, avaliando o risco de eventos neurológicos novos após dengue aguda em adultos por meio de uma coorte populacional significativa.

O que o estudo científico revelou

O estudo conduziu uma análise comparativa entre mais de 65.000 casos confirmados de dengue e mais de 1,6 milhão de indivíduos não infectados. Os pesquisadores verificaram os episódios neurológicos que surgiram até 90 dias após a infecção aguda pelo vírus da dengue, ajustando comparações e considerando variáveis demográficas e de saúde.

Os principais achados foram:

  • Maior probabilidade de eventos neurológicos novos entre infectados pelo vírus da dengue em comparação com indivíduos não infectados, especialmente nos primeiros 30 a 90 dias;

  • Risco substancialmente elevado de perda de memória, distúrbios de movimento e outras alterações neurológicas;

  • O risco mais pronunciado foi observado em adultos mais velhos e em situações de transmissão por sorotipos específicos do vírus;

  • Apesar da associação estatisticamente significativa, o fardo geral de eventos neurológicos foi modesto — ou seja, menos de um evento neurológico adicional para cada 100 casos de dengue.

Quais manifestações neurológicas podem ocorrer?

Embora a dengue não seja classicamente considerada uma doença do sistema nervoso, há registros de diversas manifestações que podem aparecer após a fase aguda da doença, incluindo:

  • Alterações cognitivas como confusão mental e perda de memória;

  • Movimentos involuntários ou distúrbios motores;

  • Encefalite e encefalopatia (inflamação ou disfunção cerebral);

  • Convulsões e irritabilidade;

  • Síndrome de Guillain-Barré, um distúrbio autoimune que causa fraqueza progressiva.

Essas condições podem surgir em períodos variáveis após a infecção inicial e exigem atenção clínica integrada para diagnóstico diferencial com outras doenças tropicais ou neurológicas.

Por que a dengue pode afetar o sistema nervoso?

A dengue é causada pelo vírus dengue (DENV), um flavivírus transmitido por mosquitos. Embora sua principal ação ocorra no sistema imune e vascular, há mecanismos pelos quais o vírus pode impactar o sistema nervoso:

  • Inflamação e resposta imune exagerada, que pode atingir o cérebro e nervos;

  • Resposta autoimune pós-infecção, desencadeando condições como Guillain-Barré;

  • Em alguns casos, neuroinvasão direta, detectada por métodos laboratoriais como PCR de líquor.

Assim, os sintomas neurológicos podem surgir sem sinais de doença grave clássica — e não apenas em dengue hemorrágica ou choque — o que reforça a necessidade de vigilância clínica cuidadosa.

Quem está mais em risco?

O estudo de coortes mostrou que adultos mais velhos têm maior probabilidade de eventos neurológicos após dengue aguda.

Outras pesquisas científicas também sugerem que:

  • Infecções por certos sorotipos do vírus (como DENV-2 e DENV-3) podem estar mais associadas a complicações neurológicas;

  • Pacientes com comorbidades ou quadro imunológico fragilizado podem ter resposta sistêmica mais intensa ao vírus.

O que os médicos e pacientes devem observar?

Após infecção por dengue, especialmente em adultos ou em casos com sintomas persistentes, fique atento a:

  • Alterações de memória ou concentração;

  • Fraqueza ou dificuldade de movimento;

  • Mudanças comportamentais ou de humor;

  • Convulsões ou dor de cabeça intensa.

  • Qualquer sinal neurológico novo que persista por mais de alguns dias.

Se esses sintomas surgirem, é essencial procurar avaliação neurológica e laboratorial, incluindo exames de imagem e eletroneuromiografia, conforme o caso.

Em Síntese: o cérebro pode sentir os efeitos da dengue

Embora a maioria dos casos de dengue evolua sem complicações graves, é importante compreender que a doença pode afetar o sistema nervoso em uma parcela dos pacientes — especialmente memória, coordenação motora e outras funções neurológicas — dentro de semanas após a fase aguda.

A pesquisa recente em grande escala amplia nossa compreensão da dengue como doença sistêmica, reforçando a necessidade de monitoramento clínico pós-infecção para garantir que sintomas neurológicos emergentes sejam identificados e tratados precocemente.

📌 Atenção aos sinais neurológicos após a dengue

  • Não ignore sintomas neurológicos novos após a infecção por dengue, mesmo semanas depois da fase aguda.

  • Procure avaliação médica imediata diante de alterações de memória, convulsões, fraqueza, confusão mental ou distúrbios de movimento.

  • Profissionais de saúde devem manter vigilância clínica pós-dengue, especialmente em adultos mais velhos.

  • O diagnóstico precoce reduz risco de sequelas, melhora o prognóstico e orienta o acompanhamento adequado.

  • Informe-se por fontes confiáveis e acompanhe conteúdos educativos no Alerta Saúde.

👉 A dengue pode ir além da febre. O cérebro também pode ser afetado — e reconhecer cedo faz diferença.

📚 Fontes científicas

  • Wee LE et al. (2025)Neurological Events Associated With Acute Dengue Infection. JAMA Neurology. Grande estudo de coorte populacional que associou dengue aguda a maior risco de eventos neurológicos em adultos. JAMA Network+1

  • Puccioni-Sohler et al. (2013) – Revisão sobre manifestações neurológicas associadas à dengue (encefalite, convulsões, meningite). SciELO

  • Estudos complementares sobre mecanismos neuroinvasivos e respostas imunes que podem explicar complicações neurológicas após dengue. PubMed

Quando a dengue passa, o sistema nervoso pode sentir os efeitos